A Esfinge Vermelha  

de Alexandre Dumas

 Alexandre Dumas transporta o leitor para o universo parisiense do século XVII, sempre com o toque de aventura de capa e espada a que já estamos habituados.

 O livro começa onde acaba Os Três Mosqueteiros, no ano de 1628, mas engane-se quem pensa que A Esfinge Vermelha é uma continuação das aventuras dos quatro inseparáveis. Aliás, nenhum dos mosqueteiros aparece e há só uma breve referência ao seu capitão, o senhor de Treville e um dos tenentes da guarda do cardeal, Jussac.

 Este livro é sobre o cardeal de Richelieu e da sua luta para que a França não sucumba a uma intriga cujo objetivo é destronar o rei Luís XIII e arruinar o cardeal. A corte é um lugar perigoso, minado por intrigas, inimigos poderosos e dissimulados que nutrem um ódio de morte ao primeiro-ministro (Richelieu). Luís XIII é uma pessoa apática, sempre vestido de negro e entediado com dia a dia do palácio do Louvre. Desconhece que os seus inimigos são aqueles que lhe são mais próximos.

 E é neste jogo louco e traiçoeiro que o autor centra a sua narrativa. Entre duelos de espada, cartas encriptadas, passagens secretas, encontros comprometedores e alianças pouco prováveis, o cerco a Luís XIII e a Richelieu vai-se apertando ao mesmo tempo que o cardeal vai desenterrando o passado e desmascarando os seus poderosos inimigos.

 Gostei particularmente do capítulo em que Richelieu, vestido de cavaleiro, bem ao jeito de um mosqueteiro, salva uma jovem mulher prisioneira que guarda um segredo de Estado terrível, pondo mesmo em causa a origem do rei Luís XIII.

 "Apesar da densidade da atmosfera, fez-se então uma luz bastante forte para que o cardeal pudesse avistar encostada à parede, defronte da janela, uma figura acocorada, com os cotovelos um farrapo de tecido que cobria da cintura aos joelhos. Os cabelos caíam-lhe pelos ombros abaixo e varriam com as pontas das lajes do chão.

 Aquela figura era lívida, repelente, tiritante. Olhava (...) na sua escuridão com uns olhos fundos, fixos, quase insensatos. (...)

 O cardeal, embora pouco sensível à dor dos outros e mesmo à sua própria dor, estremeceu dos pés à cabeça (...)

- A liberdade! - uivou, desatando a rir-se, mas com esse riso sinistro que faz estremecer (...) - A liberdade! Oh, sois então Nosso Senhor Jesus Cristo em pessoa, para dizer aos mortos: "Levantai-vos e saí dos vossos túmulos".

(...) E a prisioneira cobriu de beijos a mão do cardeal."

 Contam-se pelos dedos os fiéis a Richelieu, tais como o espadachim Étienne de Lathil ou a sua confidente, a bonita e jovem Marion Delorme, passando também pelo capitão Cavois e a sua cómica e bem-disposta mulher, senhora de Cavois, mãe de 10 filhos!

 É a senhora de Cavois que abre o negócio das "cadeirinhas", a última moda em Paris e que muito vai ajudar Richelieu na resolução dos problemas que se avizinham.

 Dumas entretém mas também não desleixa o lado pedagógico que caracteriza tão bem as suas obras. Para além de ser um contador de histórias, Alexandre Dumas é também um exímio professor de História. O leitor não vai ficar desapontado com essa componente que é uma mais-valia ao contexto histórico-social da narrativa.

 Richelieu é o herói desta história e Alexandre Dumas faz jus ao caráter deste grande de França. Nunca encarei Richelieu como um vilão no seu sentido mais literal e a leitura de A Esfinge Vermelha confirma-me esta posição em relação a este personagem histórico. Sem dúvida que continua a ser um dos inimigos mais perigosos dos três mosqueteiros e que todos vibramos quando Athos, Phortos, Aramis e o jovem D'artagnan dão a volta aos planos de Richelieu, Milady e Rochefort. Mas nesta obra, conhecemos outro lado deste personagem. É um vilão multifacetado com tons heroicos e que acaba por surpreender pela positiva (o mesmo acontece no final de Os Três Mosqueteiros).

 Não esquecer que todo o herói precisa de um grande vilão. Richelieu está no meio, o que o torna um personagem intrigante e menos óbvio.

 É um homem ao estilo do Renascimento, com visão ampla e abrangente. Homem das Artes, dá valor aos artistas e artesãos. Ele próprio escreve poesia e dramaturgia (Mirame). Em contraponto é também um estratega militar e soldado.

 Curiosamente tem pouco de clérigo, facto que não passa despercebido na obra. Luís XIII chega mesmo a compará-lo ao Diabo.

 A Esfinge Vermelha é uma das últimas obras de Alexandre Dumas. Diz-se mesmo que se encontra incompleta mas mesmo assim vale a pena visitar estas páginas, de sentir os perigos da "Estalagem da Barba Tingida", de quebrar os éditos da proibição dos duelos e bater-se ao lado do espadachim Étienne de Lathill, de percorrer os corredores do Louvre, de se aventurar numa cadeirinha pelas ruas da cidade de Paris, de presenciar os bailes da corte e os amores primaveris do conde de Moret e de Isabelle de Lautrec, de sentir a mágoa e a solidão da rainha Ana, ignorada pelo esposo e pressionada por seu irmão, rei de Espanha, a conceber um herdeiro para a França.

 Juntem-se a Alexandre Dumas e vibrem com esta aventura, bem ao estilo do clássico Os Três Mosqueteiros. En garde!

Francisco Sousa Faria da Silva

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